sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Marcha da Maconha - Agenda Local / agosto


Marcha da Maconha revela retrato da juventude brasileira: individualista e despolitizada

Tomei conhecimento esses dias que uma manifestação pelas ruas do Chile terminou em quebra-quebra.


Cerca de 100 mil pessoas foram às ruas de Santiago protestar por uma melhor educação pública no país. Também tenho acompanhado no noticiário, as contundentes manifestações populares na Grécia, que enfrenta uma grave crise econômica. Ainda, no mês de maio, na Espanha milhares de jovens protestaram nas ruas contra a séria situação político-econômica do país, que conta com altas taxas de desemprego e um quadro político complicado.
 Já aqui no Brasil, temos acompanhado pela imprensa manifestações populares como a Marcha da Maconha, a Marcha da Liberdade e a Parada Gay em São Paulo, com esta última reunindo milhões de pessoas. Em São Paulo, a Marcha da Maconha, que reuniu cerca de 700 jovens, inclusive foi reprimida com violência pela polícia e terminou por ser liberada em julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF).

Inversão de prioridades
Todos esses fatos ocorridos recentemente me levam a refletir sobre as diferenças culturais entre o Brasil e tantos outros países, como o Chile, a Grécia e a Espanha. É curioso perceber como os povos estrangeiros revelam sua indignação nas ruas contra a política, a economia, a educação de seus respectivos países de uma maneira tão forte, acalorada, indignada. Consistente, enfim. Apesar da violência exagerada dessas manifestações populares que, no Chile e na Grécia chegaram a níveis extremos que não se justificam, mesmo assim vejo como positivas as motivações desses povos para saírem às ruas e protestar, pressionar os governantes. Enquanto no Brasil, tudo o que temos são manifestações populares pedindo pela legalização do uso “recreativo” da maconha e em defesa de direitos individuais como a orientação sexual.
Vejo essas manifestações como um retrato da juventude brasileira atual. Não quero entrar no mérito aqui do direito à livre expressão, à reunião em espaços públicos, direitos garantidos pela Constituição Federal. Tampouco discutir sobre a legalização ou não do uso da maconha no Brasil. Mas o que me chama a atenção é uma questão de foco. De inversão de prioridades. Pois acredito que o Brasil, um país com tantas demandas não atendidas, com deficiências sérias na saúde pública, educação e segurança pública (para não falar da corrupção e seus sucessivos escândalos na mídia), poderia contar com seu potencial de jovens indignados para questões mais pertinentes que pedir pela liberação da maconha.

Venda de diplomas universitários
Enquanto no Chile, milhares vão às ruas para pedir por uma melhor educação pública, no Brasil, nossos jovens saem às ruas para lutar pelo direito de fumar maconha sossegadamente, sem serem importunados pela lei e pela polícia. Enquanto no Chile, o povo demonstra sua indignação com a péssima educação no país, no Brasil quase 90% dos advogados recém-formados não passaram nos exames da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). O exame, realizado em dezembro de 2010, reprovou 88% dos 106.891 bacharéis em Direito inscritos. O exame da OAB ainda revelou que 90 faculdades de Direito no país, sendo dez delas no Paraná, não aprovaram sequer um candidato inscrito. Um forte indício de a quantas anda a educação superior no país, com suas faculdades comercializando diplomas a torto e a direito. Pois segundo a OAB, as faculdades mais bem colocadas foram as públicas, enquanto que as 90 faculdades que não aprovaram nenhum inscrito são particulares. Onde está o Ministério da Educação que permite o funcionamento desses cursos? Essa situação é um crime contra a educação e os direitos do consumidor, constituído por alunos em geral de renda mais baixa que fazem sacrifícios para pagar as mensalidades e obter um diploma de curso superior que termina por não valer nada.
Não é difícil deduzir que se houvesse exames como esse da OAB para todos os cursos universitários, teríamos resultados semelhantes, dada a proliferação de faculdades sem nível algum criadas apenas para a “venda” de diplomas, contribuindo para a má qualificação profissional de milhares de jovens que saem completamente despreparados para o mercado de trabalho. É curioso perceber como ninguém fica indignado, revoltado, com uma situação dessas a ponto de sair às ruas e protestar...

Só futebol mobiliza em peso o brasileiro
É interessante ver como o brasileiro sabe cobrar tão bem, com tanta indignação, revolta e até violência, por exemplo, as decisões equivocadas do técnico de seu time de futebol ou da seleção brasileira, e se aquieta, se intimida, diante de questões como a nossa educação. No Brasil, acho que só conseguiríamos reunir 100 mil pessoas nas ruas se fosse para tirar o técnico da seleção brasileira! A partir das motivações para levar o brasileiro às ruas e protestar, pode se tirar um fiel retrato do povo brasileiro, especialmente da juventude. A percepção é que o brasileiro só tem se motivado a se mobilizar coletivamente para lutar por direitos e garantias individuais como, fumar maconha e viver livremente sua homossexualidade sem preconceito e discriminação. O diagnóstico é que os direitos pertencentes a toda uma coletividade, a uma ampla maioria da população, como saúde e educação, não são capazes de mobilizar o brasileiro para pressionar e cobrar das autoridades melhores condições. Esse retrato da juventude brasileira atual revela um individualismo brutal a serviço do interesse de minorias e possivelmente um comodismo e uma descrença na força da coletividade e no desenvolvimento da cidadania.

Falta de politização do brasileiro
É lamentável que estejamos muito aquém do nível de politização da população de países latinos como o Chile, por exemplo. E não seria o caso de dizermos que não temos problemas sérios por aqui para ir às ruas e protestar. Nossa pesada carga tributária já seria um bom motivo para a organização de uma passeata histórica. Ainda temos um recorrente festival de escândalos de corrupção - com novos esquemas desvendados a cada ano - serviços públicos de saúde caóticos e incapazes de atender a toda a demanda e uma segurança pública ineficiente, sucateada, em muitos casos, abandonada, colocando o país no ranking dos mais violentos e inseguros do mundo.

Comodismo e individualismo
Acredito que essa incapacidade do povo brasileiro se indignar e se mobilizar em protestos organizados coletivamente é resultado de uma mescla de individualismo, comodismo e resignação. É incrível perceber como o povo apanha, apanha, nas filas do SUS; pena, sua, para ganhar seu salarinho no final do mês, pegando ônibus lotado e caro todo dia, e só tem ânimo para bater no técnico de seu time, ou na torcida do time rival. Mas enquanto não nos conscientizarmos que política não se faz apenas nos redutos dos poderosos, mas é atividade para o dia-a-dia de qualquer cidadão, não vamos amadurecer como nação democrática. E vamos continuar penando, dando duro para pagar impostos de 1º mundo e recebendo serviços de 3º mundo. Já as ruas, ficam para quando a grande mídia nos mandar para lá, apenas em datas especiais, como: Carnaval, Copa do Mundo, entre outros... Isso é que é se contentar com pouco...
Quero registrar aqui que não sou contra manifestações como Parada Gay, Carnaval e outras. Mas penso que precisamos ir além. Precisamos nos conscientizar e lutar também por uma boa educação, impostos menores, segurança, saúde, fim da corrupção, etc, etc e etc.

João Aloysio
É diretor da RCC - Rede Curitibana de Comunicação. Editora dos jornais A Gazeta Cidade de Pinhais, Agenda Local, Jardim das Américas Notícias e da Lista Telefônica Local

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