segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Monteiro Lobato



O Livreiro

Entre os mais humildes comércios do mundo está o do livreiro. Embora sua mercadoria seja a base da Civilização, pois que é nela que se fixa a experiência humana, o livro não interessa ao nosso estômago nem a nossa vaidade. Não é portanto compulsoriamente adquirido. O pão diz ao homem: ou me compras ou morre de fome. O batom diz à mulher: ou me compras ou te acharão feia.
E ambos são ouvidos. Mas se o livro alega que sem ele a ignorância se perpetua, os ignorantes dão de ombros, porque é próprio da ignorância sentir-se feliz em si mesma, como o porco com a lama.
E, pois, o livreiro vende o artigo mais difícil de vender-se.
Qualquer outro lhe daria maiores lucros; ele o sabe e heroicamente permanece livreiro. E é graças a esta generosa abnegação que a árvore da cultura vai aos poucos aprofundando as suas raízes e dilatando a sua fronde. Suprima-se o livreiro e estará morto o livro – e com a morte do livro retrocederemos à Idade da Pedra, transfeitos em tapuias comedores de bichos de pau podre.
A civilização vê no Livreiro o abnegado zelador da lâmpada em que arde, perpétua, a trêmula chamazinha da cultura.

Monteiro Lobato

Fonte: Revista ANL

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